12 de jun. de 2011

PECUÁRIA DO SEMIÁRIDO PODE AJUDAR A REDUZIR O EFEITO ESTUFA


            Trabalho coordenado pela FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations), destaca o grande potencial inexplorado de seqüestro e armazenamento de carbono nos solos sob pastagens dos sistemas pastoris e agropastoris das regiões secas do planeta. Com o título de Review of evidence on drylands pastoral systems and climate change - Implications and opportunities for mitigation and adaptation, o texto editado em novembro de 2009, apresenta o manejo de pastagens como a “segunda mais importante tecnologia agrícola atualmente disponível para suavizar as alterações climáticas”. Para os autores - Constance Neely, Sally Bunning e Andreas Wilkes - a evidência deste potencial exige esforços coordenados e mecanismos de intervenção global nas barreiras sócio-político-económicas, que têm implicado na marginalização do setor. O estudo também destaca o valor da flora de sequeiro, que desenvolve mecanismos únicos para lidar com a baixa e irregular precipitação. A vegetação nativa destas regiões é altamente resistente às secas, recuperando-se rapidamente de incêndios e da pressão de pastejo. Tais atributos têm grande significado para o ecossistema global, especialmente no contexto atual de mudanças climáticas.  

No estudo os pesquisadores alertam para o fato de que as terras predominantemente utilizadas para a produção animal são áridas ou semi-áridas, portanto, particularmente sensíveis à degradação, como é o caso da África subsaariana, que tem 40 % de seu território dedicado à pecuária. Estas pastagens exigem grande atenção, não peladegradação generalizadaque apresentam e que determina uma menor capacidade de recuperação à seca e a desertificação, mas também pela sua capacidade potencial de seqüestro e armazenamento de carbono. As maiores oportunidades para seqüestro de CO2 no solo estão, justamente, em terras degradadas. A degradação significa que o solo esta longe do ponto de saturação e que, portanto, pode capturar e armazenar muito mais carbono.

O conceito de “seqüestro de carbono” foi consagrado pela Conferência de Quioto, em 1997, como um mecanismo capaz de reverter o acúmulo de CO2 na atmosfera, visando à diminuição do efeito estufa. Na fase de crescimento as plantas funcionam com verdadeiros “aspiradores” de carbono. Pela fotossíntese elas “capturam” o CO2 do ar, usando-o para compor suas folhas, caules, raízes e sementes que recebem o nome de biomassa. O carbono entra no solo através das raízes e da biomassa em decomposição. Parte deste carbono volta para a atmosfera, mas boa parte permanece no solo. Os fungos, bactérias e outros micro-organismos que ajudam na decomposição do material orgânico são, também, uma forma para que o carbono orgânico permaneça no solo. Os solos representam, portanto, um grandedepósito” de carbono. O IPCC - Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima - relata que o seqüestro de carbono pelo solo é capaz de compensar entre 5 a 15% das emissões globais deste gás. o potencial de seqüestro das pastagens brasileiras é estimado em 70 milhões de toneladas de C por ano (FAO LEAD, 2006). Recuperar os solos sob pastagens poderia também, compensar quantidades significativas das emissões globais de metano (outro importante gás do efeito estufa), pois a melhoria da qualidade das pastagens resultaria em maior produtividade animal e conseqüente redução na proporção de energia perdida como CH4.
 
O fator chave responsável pelo armazenamento de carbono em pastagens é a absorção via raízes das gramíneas. Para alcançar os objetivos de seqüestrar carbono e reverter os processos de degradação dos solos, o produtor dispõe de várias práticas como o controle dos processos erosivos, evitar as queimadas, sistemas agroflorestais e técnicas de manejo que considerem um tempo de descanso da terra suficiente para a recuperação de áreas superpastejadas. O bom manejo começa pela compreensão de que se deve utilizar a biomassa vegetal para alimentar, não apenas os rebanhos, mas também os organismos do solo, e assim, estimular as gramíneas a crescerem vigorosamente, desenvolvendo raízes saudáveis.
 
Darwin afirmava que se as árvores tivessem um cérebro deveríamos procurá-lo nas raízes e Voisin sustentava que o pasto é efetivamente criado por suas raízes.  Raízes profundas e vigorosas proporcionam vários benefícios, incluindo a aeração do solo, controle de erosão, ciclagem de nutrientes, construção do solo, aumento da capacidade de absorção e retenção de água. Elas também fornecem habitat e substrato para os organismos do solo, como as bactérias fixadoras de nitrogênio.  Com um sistema radicular vigoroso as forrageiras conseguem produzir biomassa suficiente, não para alimentar os rebanhos, mas também para a produção da “geléia bacteriana” quecola” as partículas do solo em grumos. Um solo grumoso e estruturado, torna menos penoso para a planta a adversidade do clima seco com chuvas mau distribuidas.  A bioestrutura é fundamental não apenas para que as chuvas esporádicas consigam se infiltrar e permaneçam armazenadas à disposição da planta, mas  também porque o volume de solo explorado pela raiz será maior, e a planta poderá alcançar a água em camadas mais profundas. Por esta razão, a pioneira da agroecologia no Brasil, Ana Primavesi considera que os capins são “os melhores renovadores da bioestrutura e com isso da  produtividade do solo”.
 
Alterações climáticas, perda da biodiversidade, seca e desertificação são fenômenos inter-relacionados e reflexos das agressões praticadas pelo homem ao ambiente. Como produzir alimentos para a população mundial em crescimento, sem agredir o meio ambiente é o dilema dos dias atuais. Trata-se de perseguir um duplo objetivo: produtividade e conservação dos recursos naturais. Não é possível proteger o meio ambiente na ausência de crescimento, tampouco podemos crescer esgotando o patrimônio natural não renovável. Se bem manejadas, e para isso é fundamental manter a diversidade vegetal num equilíbrio dinâmico buscando a máxima semelhança possível com a vegetação nativa, as pastagens do semi-árido podem prestar um duplo serviço: primeiro um beneficio ambiental, seqüestrando carbono, e aumentando a capacidade das regiões secas em adaptar-se aos impactos das mudanças climáticas em curso, depois um benefício econômico, reforçando a produtividade da pecuária e a segurança alimentar das populações.
José Caetano Ricci de Araújo
Eng° Agrônomo e Produtor Rural
Ipirá – Bahia
Artigo publicado no Jornal A Tarde em 27/03/2010.

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